Jornal Médico - Vítor Ramos enuncia octógono da governação clínica e de saúde

A governa&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica foi o tema do primeiro debate promovido pela USF Horizonte, no &acirc;mbito da comemora&ccedil;&atilde;o dos seus 10 anos de actividade A governa&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica foi o tema do primeiro debate promovido pela USF Horizonte, no &acirc;mbito da comemora&ccedil;&atilde;o dos seus 10 anos de actividade. V&iacute;tor Ramos e Maria Jos&eacute; Ribas apresentaram o oct&oacute;gono da governa&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica e de sa&uacute;de, um documento de trabalho que est&aacute; a ser desenvolvido pela Associa&ccedil;&atilde;o Portuguesa de M&eacute;dicos de Fam&iacute;lia desde o passado m&ecirc;s de Maio A Unidade de Sa&uacute;de Familiar (USF) Horizonte, integrada no Agrupamento de Centros de Sa&uacute;de (ACES) da Unidade Local de Sa&uacute;de de Matosinhos, est&aacute; a celebrar 10 anos de actividade assistencial. Para comemorar a data, a equipa iniciou, no passado dia 3 de Junho, um ciclo de debates. "Governa&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica" foi o tema da primeira confer&ecirc;ncia, que teve como prelectores os m&eacute;dicos V&iacute;tor Ramos, da USF Marginal, recentemente anunciado como futuro respons&aacute;vel pela coordena&ccedil;&atilde;o estrat&eacute;gica da reforma dos cuidados de sa&uacute;de prim&aacute;rios e Maria Jos&eacute; Ribas, presidente do conselho cl&iacute;nico do ACES Porto Ocidental. A discuss&atilde;o contou ainda com a contribui&ccedil;&atilde;o de Torcato Santos, presidente do conselho de administra&ccedil;&atilde;o da ULSM e de Henrique Botelho, director executivo do ACES Terras de Basto. "Ganhar a partida com qualidade" Numa partilha de ideias sobre governa&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica e de sa&uacute;de, V&iacute;tor Ramos defendeu que o actual est&aacute;dio de conhecimento nesta &aacute;rea traduz j&aacute; uma experi&ecirc;ncia de mais de 20 anos. O conjunto de conhecimentos, atitudes e capacidades de "pilotagem" cl&iacute;nica e de sa&uacute;de visa garantir que cada unidade funcional - e o agrupamento no seu todo - atingem os objectivos interm&eacute;dios e finais definidos para cada etapa do percurso da organiza&ccedil;&atilde;o. Implica, por isso, o envolvimento activo de todos os profissionais e tamb&eacute;m dos utentes e da comunidade. O termo em si - governa&ccedil;&atilde;o, governan&ccedil;a, clinical governance... - &eacute; de somenos import&acirc;ncia. O que interessa, de acordo com V&iacute;tor Ramos, &eacute; "dar sentido ao que fazemos", "alcan&ccedil;ar o objectivo" e, em definitiva, "ganhar a partida com qualidade". O oct&oacute;gono da governa&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica e de sa&uacute;de Uma vez que o objectivo dos cuidados de sa&uacute;de prim&aacute;rios &eacute;, n&atilde;o s&oacute; tratar os doentes, mas tamb&eacute;m manter e promover a sa&uacute;de, a governa&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica ter&aacute; que integrar, necessariamente, objectivos cl&iacute;nicos e de sa&uacute;de. Esta dupla perspectiva, enunciada por V&iacute;tor Ramos atrav&eacute;s da apresenta&ccedil;&atilde;o de um documento de trabalho que est&aacute; a ser desenvolvido pela Associa&ccedil;&atilde;o Portuguesa de M&eacute;dicos de Cl&iacute;nica Geral, intitulado o "oct&oacute;gono da governa&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica e de sa&uacute;de", revela caracter&iacute;sticas inovadoras. Com efeito, esta nova abordagem combina as componentes da clinical governance, iniciada no National Health Service (NHS) e derivada dos m&eacute;todos e processos da melhoria cont&iacute;nua da qualidade e de seguran&ccedil;a do doente, com a corrente da health governance defendida pela Organiza&ccedil;&atilde;o Mundial da Sa&uacute;de, orientada para objectivos de ganhos de sa&uacute;de e de bem-estar a n&iacute;vel de grupos e de popula&ccedil;&otilde;es. Oct&oacute;gono representa a converg&ecirc;ncia de conceitos Na perspectiva de V&iacute;tor Ramos, os conceitos de clinical governance defendidos pelos ingleses, poder&atilde;o ser entendidos como algo redutores, na medida em que o modelo ingl&ecirc;s se centra nos cuidados individualizados, enquanto que no nosso pa&iacute;s concorrem outras &aacute;reas, como a sa&uacute;de p&uacute;blica e populacional, a interven&ccedil;&atilde;o comunit&aacute;ria e em grupos com necessidades especiais de cuidados de sa&uacute;de. A cria&ccedil;&atilde;o das USF e, posteriormente, dos agrupamentos de centros de sa&uacute;de e respectivos conselhos cl&iacute;nicos, permite a converg&ecirc;ncia de ambas as componentes da governa&ccedil;&atilde;o, em termos "te&oacute;ricos, t&eacute;cnicos e pr&aacute;ticos". Neste novo paradigma, a governa&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica e de sa&uacute;de n&atilde;o &eacute; compat&iacute;vel com a dicotomia "uns governam versus outros s&atilde;o governados". Requer, pelo contr&aacute;rio, o envolvimento e a responsabiliza&ccedil;&atilde;o de todos os profissionais. Neste aspecto, V&iacute;tor Ramos sublinha que "uma das maiores riquezas que est&aacute; a ser introduzida nos cuidados de sa&uacute;de prim&aacute;rios &eacute; o sistema de lideran&ccedil;as emergentes plurifocais". Dando como exemplo a USF Marginal, "onde todos s&atilde;o l&iacute;deres e liderados em algum momento", o m&eacute;dico concorda que este "sistema de pilotagem" &eacute; complexo mas "apaixonante" em termos do desenvolvimento e da aprendizagem dos indiv&iacute;duos, das equipas e das organiza&ccedil;&otilde;es. Pontos de partida e de chegada bem definidos O planeamento, a organiza&ccedil;&atilde;o e a direc&ccedil;&atilde;o das actividades das equipas e dos servi&ccedil;os cl&iacute;nicos, baseiam-se na defini&ccedil;&atilde;o pr&eacute;via de objectivos claramente formulados, quer em termos de resultados, quer em termos de processos. Fazendo um paralelismo com uma viagem, V&iacute;tor Ramos aponta que a governa&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica e de sa&uacute;de implica a exist&ecirc;ncia de pontos de partida e a defini&ccedil;&atilde;o de pontos de chegada. Caso contr&aacute;rio, "corre-se o risco de andar &agrave; deriva", sendo esta "uma das situa&ccedil;&otilde;es que mais desmotiva a natureza humana". A defini&ccedil;&atilde;o dos meios e estrat&eacute;gias de "navega&ccedil;&atilde;o", avalia&ccedil;&atilde;o e monitoriza&ccedil;&atilde;o permanente dos resultados, s&atilde;o outras vertentes essenciais do processo, sem as quais n&atilde;o ser&aacute; poss&iacute;vel "corrigir a rota", quando necess&aacute;rio, nem conhecer, em cada momento, o caminho percorrido e o quanto falta para atingir a meta. J&aacute; em termos organizacionais, V&iacute;tor Ramos afirma que o desafio consiste em criar nos agrupamentos de centros de sa&uacute;de "uma rede multipolar de iniciativa e de lideran&ccedil;a, enquadrada de forma inteligente nos dispositivos hier&aacute;rquicos"; como que a introdu&ccedil;&atilde;o de uma pluriarquia no "miolo" da pir&acirc;mide hier&aacute;rquica. Exemplos de aplica&ccedil;&atilde;o pr&aacute;tica nos ACES A centraliza&ccedil;&atilde;o na pessoa, a gest&atilde;o do risco cl&iacute;nico, os recursos humanos, a melhoria cont&iacute;nua dos processos, a adequa&ccedil;&atilde;o de cuidados, a inova&ccedil;&atilde;o e desenvolvimento, a presta&ccedil;&atilde;o de contas e resultados e ganhos em sa&uacute;de formam os lados do oct&oacute;gono enunciado por V&iacute;tor Ramos. Maria Jos&eacute; Ribas, apesar de n&atilde;o ter estado na g&eacute;nese do oct&oacute;gono da governa&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica e de sa&uacute;de, decidiu analis&aacute;-lo com detalhe, com o objectivo de retirar dele o maior partido poss&iacute;vel para o seu trabalho. E num interessante exerc&iacute;cio pr&aacute;tico, prop&ocirc;s uma s&eacute;rie de projectos e de iniciativas suscept&iacute;veis de serem enquadrados em cada um dos lados do oct&oacute;gono. Por exemplo, ao n&iacute;vel da gest&atilde;o do risco cl&iacute;nico (que integra as vertentes de seguran&ccedil;a, preven&ccedil;&atilde;o e gest&atilde;o de eventos adversos), algumas linhas de interven&ccedil;&atilde;o poder&atilde;o passar por projectos de vigil&acirc;ncia das complica&ccedil;&otilde;es associadas ao tratamento com determinados medicamentos ou dos efeitos adversos da polifarm&aacute;cia. Ainda no &acirc;mbito da seguran&ccedil;a do doente, aquela respons&aacute;vel sublinha a necessidade de construir um sistema de notifica&ccedil;&atilde;o de reac&ccedil;&otilde;es adversas, algo que poder&aacute; ser iniciado com um "di&aacute;rio de bordo" destinado ao registo de ocorr&ecirc;ncias. J&aacute; ao n&iacute;vel da "adequa&ccedil;&atilde;o de cuidados" (acessibilidade, continuidade, longitudinalidade, efectividade, flexibilidade e integra&ccedil;&atilde;o), a m&eacute;dica prop&otilde;e, por exemplo, um sistema de gest&atilde;o dos cuidados ao domic&iacute;lio, atrav&eacute;s do qual seja poss&iacute;vel integrar toda a informa&ccedil;&atilde;o m&eacute;dica e de enfermagem, com o objectivo &uacute;ltimo de evitar falhas na presta&ccedil;&atilde;o de cuidados. Ainda nesta &aacute;rea, Maria Jos&eacute; Ribas salienta a necessidade de uma "articula&ccedil;&atilde;o real, franca e igualit&aacute;ria" entre os cuidados de sa&uacute;de prim&aacute;rios e secund&aacute;rios, no sentido de tornar mais fluida a informa&ccedil;&atilde;o e comunica&ccedil;&atilde;o entre ambos os n&iacute;veis de cuidados. Comunidades de pr&aacute;ticas promovem a partilha em rede Na &aacute;rea da "melhoria cont&iacute;nua de processos" (utiliza&ccedil;&atilde;o de normas de orienta&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica e prescri&ccedil;&atilde;o racional, entre outras), uma possibilidade avan&ccedil;ada por Maria Jos&eacute; Ribas passa pela implementa&ccedil;&atilde;o de projectos em &aacute;reas t&atilde;o d&iacute;spares como a sa&uacute;de materna (aumento das taxas de revis&atilde;o do puerp&eacute;rio nas mulheres seguidas nesta consulta, por exemplo) ou a avalia&ccedil;&atilde;o do impacto das normas de orienta&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica (NOC) no diagn&oacute;stico e tratamento de determinadas patologias. Neste &acirc;mbito, a m&eacute;dica defende a cria&ccedil;&atilde;o de "comunidades de pr&aacute;ticas". A ideia &eacute; por em marcha um processo interactivo de constru&ccedil;&atilde;o progressiva de uma cultura t&eacute;cnico-cient&iacute;fica pr&oacute;pria, que vise a harmoniza&ccedil;&atilde;o da linguagem, vis&atilde;o, procedimentos e instrumentos de trabalho. De acordo com Maria Jos&eacute; Ribas, "temos que passar de uma etapa em que cada grupo trabalhava para si para uma fase de partilha em rede". As pessoas no centro do sistema Al&eacute;m dos eixos fundamentais representados pelos lados do oct&aacute;gono relativos aos "resultados e ganhos em sa&uacute;de" e "presta&ccedil;&atilde;o de contas", que constituem como que o norte e o sul das equipas e das organiza&ccedil;&otilde;es, Maria Jos&eacute; Ribas salienta ainda a governa&ccedil;&atilde;o centrada nas pessoas, a avalia&ccedil;&atilde;o das suas necessidades, a preocupa&ccedil;&atilde;o com a equidade e a satisfa&ccedil;&atilde;o dos utentes. Uma das linhas de trabalho nesta &aacute;rea passa, por exemplo, pelo equil&iacute;brio da oferta de cuidados correctos &agrave; popula&ccedil;&atilde;o e a ausculta&ccedil;&atilde;o regular das opini&otilde;es e expectativas dos utentes, algo que come&ccedil;a a fazer parte da cultura das organiza&ccedil;&otilde;es. Nomeadamente, das USF, que possuem j&aacute; uma larga experi&ecirc;ncia neste dom&iacute;nio. "Pensar nos profissionais que trabalham nas equipas" &eacute; outra das vertentes do oct&oacute;gono. "Temos pouco h&aacute;bito de cuidar das pessoas que trabalham connosco" quando os recursos humanos s&atilde;o um aspecto fulcral da governa&ccedil;&atilde;o, aponta Maria Jos&eacute; Ribas. Forma&ccedil;&atilde;o e desenvolvimento profissional, motiva&ccedil;&atilde;o da equipa, preven&ccedil;&atilde;o da s&iacute;ndrome de exaust&atilde;o, gest&atilde;o das compet&ecirc;ncias, planeamento...Trata-se, de facto, de uma &aacute;rea onde &eacute; poss&iacute;vel - e necess&aacute;rio - desenvolver ainda muito trabalho. Entre outras linhas de actua&ccedil;&atilde;o, a m&eacute;dica aponta a realiza&ccedil;&atilde;o peri&oacute;dica de inqu&eacute;ritos de satisfa&ccedil;&atilde;o, como tem vindo a acontecer, de forma regular, nas unidades de sa&uacute;de familiar. Ao n&iacute;vel da preven&ccedil;&atilde;o e gest&atilde;o do stress, o projecto desenvolvido no ACES Porto Ocidental &eacute; um exemplo interessante. De acordo com Maria Jos&eacute; Ribas, o problema foi identificado ainda na fase de prepara&ccedil;&atilde;o das equipas e dos servi&ccedil;os para enfrentarem a pandemia de Gripe A. A partir da&iacute;, foi criado um canal de comunica&ccedil;&atilde;o, via e-mail, com a Psicologia, atrav&eacute;s do qual os profissionais podem trocar impress&otilde;es at&eacute; se sentirem capacitados para lidar com a situa&ccedil;&atilde;o profissional - ou pessoal - que est&atilde;o a vivenciar. Estes s&atilde;o apenas alguns exemplos dos muitos projectos que podem ser desenvolvidos na &aacute;rea da governa&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica e de sa&uacute;de. Com a cria&ccedil;&atilde;o dos agrupamentos de centros de sa&uacute;de, Maria Jos&eacute; Ribas considera que se verificou uma "colagem" da governa&ccedil;&atilde;o aos conselhos cl&iacute;nicos. Mas, na sua perspectiva, esta &eacute; uma tarefa "individual e das equipas" e um trabalho que dever&aacute; ser sustentado por uma rede de partilha de conhecimentos.

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