Jornal Médico - Uma bandeira que sobrevive… Sob ataque!

O SNS completou, no passado dia 15... 31 anos de exist&ecirc;ncia. Pelo segundo ano consecutivo, o Dia Nacional do SNS... O SNS completou, no passado dia 15... 31 anos de exist&ecirc;ncia. Pelo segundo ano consecutivo, o Dia Nacional do SNS foi assinalado em cerim&oacute;nia oficial. No encontro, algumas das mais destacadas personalidades do sector, fizeram um balan&ccedil;o dos progressos, reequacionaram as dificuldades e perspectivaram os caminhos a seguir por aquele que &eacute; considerado o servi&ccedil;o-bandeira da democracia portuguesa... A prop&oacute;sito da efem&eacute;ride - e numa altura em que o SNS enfrenta amea&ccedil;as e obst&aacute;culos v&aacute;rios - o nosso jornal foi auscultar a opini&atilde;o de alguns ex-ministros da Sa&uacute;de sobre o futuro do Servi&ccedil;o Nacional de Sa&uacute;de No despontar de uma nova d&eacute;cada, o Servi&ccedil;o Nacional de Sa&uacute;de (SNS) - criado a 15 de Setembro de 1979, com a aprova&ccedil;&atilde;o da respectiva Lei de Bases - comemora 31 anos de uma exist&ecirc;ncia nem sempre pac&iacute;fica, pautada por altos e baixos, obst&aacute;culos e amea&ccedil;as constantes &agrave; sua sustentabilidade. Num momento especialmente sens&iacute;vel, em que o SNS se v&ecirc; transformado em arma de arremesso pol&iacute;tico e &agrave; boleia da comemora&ccedil;&atilde;o da efem&eacute;ride, o Jornal M&eacute;dico de Fam&iacute;lia conversou com antigos ministros da Sa&uacute;de, numa viagem pela hist&oacute;ria e evolu&ccedil;&atilde;o de um servi&ccedil;o p&uacute;blico que se confunde com a pr&oacute;pria hist&oacute;ria da democracia portuguesa. Nome incontorn&aacute;vel desta hist&oacute;ria, &eacute; o do ex-ministro dos Assuntos Sociais e "criador" do SNS, Ant&oacute;nio Arnaut, que ao nosso jornal recordou a "forma dificultosa e os v&aacute;rios obst&aacute;culos que o SNS teve que vencer, imediatamente no seu arranque". Uma das primeiras amea&ccedil;as, lembra, foi um decreto publicado em 1982 pelo Governo de Pinto Balsem&atilde;o, atrav&eacute;s do qual se pretendia revogar a Lei de Bases do SNS. "Felizmente, esse decreto foi rejeitado pelo Tribunal Constitucional, que declarou que o SNS era uma conquista irrevers&iacute;vel e que, apesar de poder ser alterado, jamais poderia ser extinto", sublinhou o hist&oacute;rico socialista, em declara&ccedil;&otilde;es ao nosso jornal. Em 1989, o SNS "sofreu outra investida com a revis&atilde;o constitucional e, mais tarde - no Governo de Cavaco Silva, sendo Arlindo de Carvalho Ministro da Sa&uacute;de -, outra ainda mais perigosa, com a publica&ccedil;&atilde;o da Lei 48/90", aponta o "Pai" da institui&ccedil;&atilde;o. "Esta altera&ccedil;&atilde;o legislativa veio substituir o conceito de Servi&ccedil;o Nacional de Sa&uacute;de pelo conceito de Sistema Nacional de Sa&uacute;de, passando o sistema a dominar o pr&oacute;prio servi&ccedil;o, quando deve ser o contr&aacute;rio, segundo a Constitui&ccedil;&atilde;o". Isto "porque o SNS deve prestar cuidados a todos, com as actividades privadas, sociais e cooperativas a terem uma fun&ccedil;&atilde;o complementar", lembra Arnaut. Para Arnaut, houve um "facto hist&oacute;rico" que poder&aacute; ter contribu&iacute;do, em grande medida, para que o SNS nunca sofresse um retrocesso "fatal", apesar das amea&ccedil;as constantes. "Antes da Lei de Bases ser aprovada - mais propriamente a 29 de Julho de 1978 -, publiquei um despacho que lan&ccedil;ou os alicerces do actual SNS. Esse despacho tornava extens&iacute;vel a toda a popula&ccedil;&atilde;o os servi&ccedil;os m&eacute;dico-sociais, tanto nos cuidados de sa&uacute;de prim&aacute;rios (CSP), como nos cuidados hospitalares, abrangendo ainda a comparticipa&ccedil;&atilde;o dos medicamentos". A partir da&iacute;, a popula&ccedil;&atilde;o passou a ir aos centros de sa&uacute;de (CS) de forma gratuita e a beneficiar de comparticipa&ccedil;&atilde;o medicamentosa, o que levou os cidad&atilde;os a interiorizarem a ideia da Sa&uacute;de como um direito e tornou politicamente impopular qualquer medida posterior que pusesse em risco esse direito, recorda o antigo governante. Desta forma, "o SNS resistiu &agrave;s investidas de algumas for&ccedil;as de Direita - e digo algumas, porque o SNS &eacute; o &uacute;nico servi&ccedil;o que re&uacute;ne o consenso de todos os quadrantes pol&iacute;ticos -, conseguiu triunfar e alcan&ccedil;ar os 31 anos de exist&ecirc;ncia, sendo considerado como a grande conquista social do s&eacute;culo XX portugu&ecirc;s", salienta. Preocupado, q.b. Mais recentemente, o SNS viu-se sujeito a nova e "feroz" investida por parte do PSD: uma proposta de revis&atilde;o constitucional que, no entender de Ant&oacute;nio Arnaut, revela Passos Coelho como "um instrumento ao servi&ccedil;o do l&oacute;bi dos interesses privados da sa&uacute;de" (ver caixa). "Critico fortemente esta proposta, mas n&atilde;o me preocupa, na medida em que estou confiante de que jamais ser&aacute; aprovada no Parlamento", assegurou o antigo ministro ao M&eacute;dico de Fam&iacute;lia. "O que realmente me preocupa &eacute; a investida neo-liberal, a influ&ecirc;ncia nefasta de grupos econ&oacute;micos que s&atilde;o muito mais poderosos hoje do que h&aacute; 30 anos atr&aacute;s", aponta. Na opini&atilde;o do socialista h&aacute;, "na Sa&uacute;de, interesses poderos&iacute;ssimos, que obliteram a intelig&ecirc;ncia e a sensibilidade a muita boa gente. &Eacute; dessa influ&ecirc;ncia que tenho receio...". De acordo com Arnaut, "esses interesses exercem a sua influ&ecirc;ncia, por vezes com &ecirc;xito, em todos os partidos pol&iacute;ticos, governos e at&eacute; ao n&iacute;vel da Uni&atilde;o Europeia, levando &agrave; aprova&ccedil;&atilde;o (ou n&atilde;o) de determinadas directrizes". Apesar do peso que os grupos econ&oacute;micos privados exercem no sector, "penso que o SNS &eacute; uma conquista incontorn&aacute;vel e todos compreendem a sua indispensabilidade para garantir a justi&ccedil;a e a coes&atilde;o social, pelo que continuar&aacute; a resistir a todas as amea&ccedil;as". De acordo com o ex-ministro dos Assuntos Sociais do II Governo Constitucional, "quando a direita fala em livre escolha, est&aacute; a promover uma Medicina de primeira para os ricos e uma Medicina de segunda para os pobres, porque a livre escolha, na realidade, j&aacute; existe. O fundamento do SNS n&atilde;o &eacute; ideol&oacute;gico, mas &eacute;tico. Se a Sa&uacute;de &eacute; um direito, tem que ser gratuita para todos, em situa&ccedil;&atilde;o de igualdade. Se for um privil&eacute;gio, o acesso depender&aacute; da condi&ccedil;&atilde;o econ&oacute;mica de cada um. O que vem dizer a proposta de Passos Coelho &eacute; que seriam estabelecidos escal&otilde;es de pagamento, o que, invariavelmente, levaria a uma fuga para o privado da classe m&eacute;dia, que a ter que pagar alguma coisa optaria pelos servi&ccedil;os de sa&uacute;de privados. E o SNS sobreviveria como um servi&ccedil;o residual para os pobres"... Em 2020, o "pai" do SNS, Ant&oacute;nio Arnaut, espera que este "funcione melhor, j&aacute; preste servi&ccedil;os aos subsistemas de sa&uacute;de (designadamente &agrave; ADSE) e tenha a funcionar a h&aacute; muito reclamada val&ecirc;ncia de sa&uacute;de oral". O hist&oacute;rico socialista deseja ainda que, daqui a 10 anos, "todas as USF previstas estejam a funcionar e que a RNCCI j&aacute; esteja totalmente implantada no terreno" Citando Sampaio Bruno, na sua c&eacute;lebre frase "A P&aacute;tria &eacute; uma comunh&atilde;o de solidariedades", Arnaut defende que "o SNS concretiza essa comunh&atilde;o". E &eacute; por isso que n&atilde;o pode haver pagamento no acto, porque isso implicaria uma discrimina&ccedil;&atilde;o. H&aacute; pagamento e diferencia&ccedil;&atilde;o no sistema fiscal e &eacute; por isso que o argumento que cada um deveria pagar de acordo com a classe econ&oacute;mica &eacute; enganador e n&atilde;o faz sentido". Na senda do Estado Social Projectando o olhar para o futuro pr&oacute;ximo, o hist&oacute;rico socialista espera que, daqui a 10 anos, o SNS "funcione melhor, j&aacute; preste servi&ccedil;o aos subsistemas de sa&uacute;de, designadamente &agrave; ADSE, e j&aacute; disponha da val&ecirc;ncia h&aacute; muito reclamada de sa&uacute;de oral". Em 2020 - "ano em que a revolu&ccedil;&atilde;o liberal comemora 200 anos - Arnaut espera, igualmente, ver todas as unidades de sa&uacute;de familiar (USF) previstas em funcionamento e a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) implementada no terreno, de forma a garantir as respostas necess&aacute;rias nesta &aacute;rea. Para o final da d&eacute;cada que em breve se inicia, o ex-governante expressa, ainda, um outro desejo: "que j&aacute; estejamos pr&oacute;ximos da rep&uacute;blica social de que falava Antero de Quental e a que n&oacute;s chamamos de Estado Social". "O SNS tem de ser melhorado, mas pode ser melhorado independentemente das verbas porque h&aacute; servi&ccedil;os que podem gastar menos e funcionar melhor", advoga Arnaut. Para o hist&oacute;rico socialista, o aumento do investimento deveria incidir no refor&ccedil;o da rede de cuidados continuados e paliativos, que j&aacute; est&aacute; espalhada pelo pa&iacute;s, e na cria&ccedil;&atilde;o de uma outra de medicina oral, que praticamente n&atilde;o existe. Por outro lado, observa o antigo ministro dos Assuntos Sociais, "no momento de crise que vivemos, o sector social tem de ser refor&ccedil;ado para compensar as desigualdades que agora se agravaram atrav&eacute;s do desemprego e de outras situa&ccedil;&otilde;es de precariedade". Arnaut n&atilde;o hesita em apontar respons&aacute;veis pol&iacute;ticos... "Infelizmente, muitos pol&iacute;ticos da actualidade n&atilde;o t&ecirc;m uma cultura p&aacute;tria, da nossa Hist&oacute;ria, da evolu&ccedil;&atilde;o da sociedade pol&iacute;tica e vivem para o imediatismo", critica. O apelo de Ant&oacute;nio Arnaut estende-se ainda ao Presidente da Rep&uacute;blica: "tem um poder moderador, no sentido &eacute;tico e moral, de tentar conciliar as desaven&ccedil;as in&uacute;teis". Em defesa do SNS: manifesto contra proposta de revis&atilde;o constitucional de Passos Coelho "O Dr. Passos Coelho est&aacute; a ser um instrumento ao servi&ccedil;o do l&oacute;bi dos interesses privados da sa&uacute;de", afirmou, h&aacute; dias, Ant&oacute;nio Arnaut, um dos signat&aacute;rios de um manifesto, recentemente divulgado, em defesa do SNS e contra "recentes inten&ccedil;&otilde;es de revis&atilde;o constitucional" avan&ccedil;adas pelo PSD, que prop&otilde;e o "abandono dos princ&iacute;pios da universalidade" e "abandono da tendencial gratuitidade" do sistema. "[Passos Coelho] &eacute; um instrumento dos interesses que est&atilde;o por tr&aacute;s dele. H&aacute; grandes interesses envolvidos no sector da Sa&uacute;de, que representa um ter&ccedil;o do Or&ccedil;amento do Estado - mais de nove mil milh&otilde;es de euros por parte do Estado - sendo um sector apetec&iacute;vel para os neg&oacute;cios. Mas, simplesmente, a sa&uacute;de n&atilde;o &eacute; um neg&oacute;cio", acusou o hist&oacute;rico do PS, em declara&ccedil;&otilde;es &agrave; ag&ecirc;ncia Lusa. Para o "pai" do SNS, o sector privado da sa&uacute;de "tem um papel importante, mas complementar". No seu anteprojecto de revis&atilde;o constitucional, o PSD prop&otilde;e que "o direito &agrave; protec&ccedil;&atilde;o da sa&uacute;de" continue a ser assegurado "atrav&eacute;s de um servi&ccedil;o nacional de sa&uacute;de universal e geral". Mas onde se lia "tendo em conta as condi&ccedil;&otilde;es econ&oacute;micas e sociais dos cidad&atilde;os, tendencialmente gratuito", o PSD prop&otilde;e o seguinte texto: "N&atilde;o podendo, em caso algum, o acesso ser recusado por insufici&ecirc;ncia de meios econ&oacute;micos". Para Ant&oacute;nio Arnaut, a aprova&ccedil;&atilde;o da proposta social-democrata significaria "um regresso ao Estado Novo. O que o Dr. Passos Coelho quer &eacute; regressar a um modelo salazarento, em que as pessoas s&atilde;o tratadas diferentemente na sa&uacute;de, conforme a sua situa&ccedil;&atilde;o econ&oacute;mica", acusa. Para logo acrescentar: "se a proposta de revis&atilde;o constitucional do PSD fosse aprovada, o SNS acabaria como servi&ccedil;o geral, universal e gratuito. Isso levaria que quem tivesse que pagar uma percentagem significativa para o SNS deixaria de o fazer e faria um seguro de sa&uacute;de para recorrer aos servi&ccedil;os privados. O objectivo n&atilde;o &eacute; fazer com que os ricos paguem, &eacute; fazer com que os ricos e a classe m&eacute;dia deixem de recorrer aos servi&ccedil;os p&uacute;blicos para engrossar a clientela do sector privado".

Terceiro espaço

Mais lidas