Jornal Médico - Ética e direito médico na prática clínica

O "consentimento informado" &eacute; um paradigma relativamente recente da rela&ccedil;&atilde;o equipa de sa&uacute;de/doente... O "consentimento informado" &eacute; um paradigma relativamente recente da rela&ccedil;&atilde;o equipa de sa&uacute;de/doente. Come&ccedil;ou por ser mais vis&iacute;vel nos cuidados de sa&uacute;de secund&aacute;rios mas os especialistas sublinham que o processo &eacute; transversal a todo o tipo de cuidados. Nos CSP a discuss&atilde;o centra-se, sobretudo, ao n&iacute;vel da rela&ccedil;&atilde;o &eacute;tica m&eacute;dico/doente e da acessibilidade de cuidados Na an&aacute;lise &eacute;tica das quest&otilde;es e problemas m&eacute;dicos, s&atilde;o geralmente evocados quatro princ&iacute;pios b&aacute;sicos: autonomia, benefic&ecirc;ncia, justi&ccedil;a e n&atilde;o malefic&ecirc;ncia. De acordo com a m&eacute;dica de fam&iacute;lia Mercedes Perez Fernandez, presidente do Comit&eacute; de &Eacute;tica da Rede Espanhola de Cuidados de Sa&uacute;de Prim&aacute;rios, "os dois primeiros pertencem ao &acirc;mbito privado (&eacute;tica de m&iacute;nimos), submetendo-se aos segundos (&eacute;tica dos m&aacute;ximos), de &acirc;mbito p&uacute;blico". "Mas a &eacute;tica na consulta vai muito al&eacute;m, embora se confundam, frequentemente, as suas aplica&ccedil;&otilde;es pr&aacute;ticas". Nesse sentido, a especialista defende que o debate deve centrar-se, sobretudo, na rela&ccedil;&atilde;o m&eacute;dico/doente e na acessibilidade, em vez de se focalizar em temas mais transcendentes - como a eutan&aacute;sia ou a manipula&ccedil;&atilde;o gen&eacute;tica -, mas com menor aplica&ccedil;&atilde;o na pr&aacute;tica di&aacute;ria do m&eacute;dico de fam&iacute;lia. Irracionalidade rom&acirc;ntica versus irracionalidade t&eacute;cnica A actual rela&ccedil;&atilde;o do m&eacute;dico, numa organiza&ccedil;&atilde;o p&uacute;blica de sa&uacute;de, "coloca imediatamente uma tens&atilde;o entre a irracionalidade rom&acirc;ntica - tudo para o paciente! - e a irracionalidade t&eacute;cnica - tudo para a organiza&ccedil;&atilde;o!". Esta tens&atilde;o, que a m&eacute;dica aponta como uma das quest&otilde;es fundamentais da &eacute;tica nos cuidados de sa&uacute;de prim&aacute;rios, "pode ser for&ccedil;ada com os incentivos, sejam eles directos ou globais". Estes pretendem "alinhar os interesses do m&eacute;dico com os da sociedade". Mas essa inten&ccedil;&atilde;o "nem sempre &eacute; clara e nem sempre cumpre os seus objectivos". Para complicar a quest&atilde;o, Mercedes Fernandez acrescenta que "os m&eacute;dicos tamb&eacute;m t&ecirc;m outros interesses. Desde aumentar o ordenado - quando se tem um sal&aacute;rio, podem-se aumentar os rendimentos, dedicando menos tempo ao trabalho, chegando tarde e saindo cedo...- &agrave; atrac&ccedil;&atilde;o pela tecnologia, que muitas vezes pode interferir e mudar a pr&aacute;tica cl&iacute;nica de forma irrazo&aacute;vel". Os pacientes e a sociedade "t&ecirc;m o direito a receber os melhores cuidados". No entanto, a especialista defende que isso n&atilde;o deveria significar "tudo para todos" mas "uma an&aacute;lise precisa das necessidades de todos e, consequentemente, a resolu&ccedil;&atilde;o dos problemas de acordo com a sua relev&acirc;ncia e a vulnerabilidade da pessoa". Na sua perspectiva, s&oacute; dessa forma ser&aacute; poss&iacute;vel "enfrentar os problemas da equidade e tentar reverter a lei dos cuidados inversos". Consentimento informado &eacute; transversal a todo o sistema de sa&uacute;de O "consentimento informado" &eacute; um paradigma relativamente recente da rela&ccedil;&atilde;o equipa de sa&uacute;de/doente. No entanto, "constitui um processo transversal a essa rela&ccedil;&atilde;o, n&atilde;o se limitando a um momento", aponta Rosalvo Almeida, presidente da Comiss&atilde;o de &Eacute;tica para a Sa&uacute;de da ARS Norte e membro do Conselho Nacional de &Eacute;tica para as Ci&ecirc;ncias da Vida. "O consentimento informado, esclarecido e livre, &eacute; uma forma de manifesta&ccedil;&atilde;o de vontade, que se destina a respeitar o direito do doente a decidir sobre a sua sa&uacute;de. Pode ser pedido a todo o adulto capaz de o dar ou ao seu representante, no caso de menores de idade ou de pessoas que n&atilde;o tenham o discernimento necess&aacute;rio para avaliar o seu sentido e alcance". Neste &acirc;mbito, o especialista sublinha que "todo o adulto &eacute; considerado capaz de consentir, at&eacute; prova em contr&aacute;rio. A iliteracia, o analfabetismo ou as manifesta&ccedil;&otilde;es de incompreens&atilde;o n&atilde;o s&atilde;o raz&otilde;es para deixar de tentar obter um consentimento livre e esclarecido, antes obrigam a melhores explica&ccedil;&otilde;es e a informa&ccedil;&atilde;o mais adequada". Mesmo em casos de menoridade ou defici&ecirc;ncia, "em respeito pela autonomia da pessoa, deve ser dada a adequada informa&ccedil;&atilde;o e considerado, com razoabilidade, o direito do pr&oacute;prio &agrave; recusa de tratamento ou exames". Apresenta&ccedil;&atilde;o p&uacute;blica de relatos de caso... s&oacute; com consentimento Na sua interven&ccedil;&atilde;o, Rosalvo Almeida mencionou igualmente as quest&otilde;es mais relevantes relativas &agrave; participa&ccedil;&atilde;o de doentes em estudos observacionais na &aacute;rea dos cuidados de sa&uacute;de prim&aacute;rios. Um documento-guia adoptado pela Comiss&atilde;o de &Eacute;tica da ARS Norte para a an&aacute;lise dos estudos que lhe s&atilde;o submetidos, refere que o consentimento informado &eacute; essencial em tr&ecirc;s situa&ccedil;&otilde;es: "participa&ccedil;&atilde;o em ensaios cl&iacute;nicos", "participa&ccedil;&atilde;o pessoal em trabalhos de investiga&ccedil;&atilde;o cl&iacute;nica ou epidemiol&oacute;gica" e, por &uacute;ltimo, "publica&ccedil;&atilde;o ou apresenta&ccedil;&atilde;o p&uacute;blica de relatos de caso". No referido documento - publicado na p&aacute;gina da ARS Norte (www.arsnorte.min-saude.pt) - refere-se ainda que o consentimento informado s&oacute; dever&aacute; ser dado quando a pessoa que consente j&aacute; tiver, na sua posse, um documento onde conste "o nome do investigador", "o t&iacute;tulo e a descri&ccedil;&atilde;o sum&aacute;ria dos objectivos do estudo, m&eacute;todos e enquadramento acad&eacute;micos". &Eacute; tamb&eacute;m imprescind&iacute;vel a "garantia formal de confidencialidade e de oculta&ccedil;&atilde;o da identidade dos participantes", o reconhecimento do "direito do participante a revogar o consentimento" e, por &uacute;ltimo, "informa&ccedil;&atilde;o sum&aacute;ria sobre o financiamento do estudo". A rela&ccedil;&atilde;o entre duas pessoas &eacute;, em primeiro lugar, uma rela&ccedil;&atilde;o &eacute;tica Desta sess&atilde;o destacou-se ainda a interven&ccedil;&atilde;o do Prof. Daniel Serr&atilde;o, especialista em Bio&eacute;tica, que come&ccedil;ou por afirmar que "a rela&ccedil;&atilde;o entre duas pessoas &eacute;, em primeiro lugar, uma rela&ccedil;&atilde;o &eacute;tica e s&oacute; depois uma rela&ccedil;&atilde;o profissional". "O Homem &eacute; um ser social e tem de se relacionar com os outros num universo &eacute;tico". Esta "&eacute;tica dialogal" dever&aacute; estar sempre presente na rela&ccedil;&atilde;o entre o m&eacute;dico e o doente. Na perspectiva do docente, "a &eacute;tica &eacute; uma capacidade da intelig&ecirc;ncia" e &eacute; esta capacidade humana que permite actuar e tomar decis&otilde;es ap&oacute;s uma pondera&ccedil;&atilde;o de valores. Segundo Daniel Serr&atilde;o, os valores "nascem exclusivamente das percep&ccedil;&otilde;es individuais" e &eacute; atrav&eacute;s da pondera&ccedil;&atilde;o dessas percep&ccedil;&otilde;es que se constroem imagens e se tomam decis&otilde;es. O consentimento informado surge, simultaneamente, como um valor e uma norma jur&iacute;dica. De acordo com o artigo 156 do C&oacute;digo Penal portugu&ecirc;s, "o m&eacute;dico que actue sobre uma pessoa sem ter obtido o pr&eacute;vio consentimento do paciente incorre em responsabilidade penal, com pena de pris&atilde;o at&eacute; tr&ecirc;s anos".

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