Jornal Médico - Lino Gonçalves: “Ainda há muito a fazer para reduzir o impacto da doença cardiovascular em Portugal”

Lino Gonçalves é, desde o dia 1 de maio, o novo presidente da Direção da Sociedade Portuguesa de Cardiologia (SPC) para o biénio 2021-2023. Em entrevista ao Jornal Médico, o dirigente destaca que a sua equipa irá apostar na continuidade, mas também na inovação. A revisão dos estatutos é uma das suas prioridades. Mas não só. A literacia em saúde cardiovascular, a formação pré-graduada e a realização de estudos prospetivos e investigação translacional são outras das apostas. JORNAL MÉDICO (JM) | Qual o grande desafio, ou desafios, que espera encontrar ao assumir a presidência da Sociedade Portuguesa de Cardiologia (SPC)? Lino Gonçalves (LG) | Considero que a incerteza da pandemia – e a forma como vai evoluir nos próximos meses e ainda durante o ano de 2022 – será ainda o grande desafio da minha presidência. Sabemos que a direção cessante foi fortemente impactada pela Covid-19 neste último ano e meio, o que dificultou a sua atuação. Portanto, penso que este clima de incerteza, nomeadamente sobre os reais efeitos da pandemia na sociedade e nos doentes cardiovasculares, constituirá a maior adversidade. Mas, obviamente que estaremos atentos à sua evolução e empenhados em desenvolver estratégias que permitam ultrapassar as dificuldades. JM | Em que pilares irá assentar o seu mandato? LG | Irá assentar em dois pilares essenciais: a continuidade e a inovação, constituindo o primeiro um dos “segredos” do sucesso da Sociedade Portuguesa de Cardiologia. De facto, todas as direções ao longo dos anos têm tido o cuidado de dar continuidade aos projetos, construir sobre os mesmos, e trazer mais alguma inovação e contributos para o seu seio e para a medicina cardiovascular portuguesa. Esta continuidade, o prosseguir de um caminho, faz particularmente sentido neste mandato, uma vez que iremos completar alguns dos projetos iniciados pela direção cessante – já identificados em conjunto pelas duas direções – que não foram possíveis de implementar atempadamente devido à pandemia por Covid-19. Entre eles está o projeto Porthus, um estudo de grande dimensão que pretende avaliar a prevalência real e caracterizar clinicamente a insuficiência cardíaca em Portugal. JM | Em termos de inovação, quais são as novidades que se podem esperar da sua presidência? Desde logo, estamos empenhados em promover a revisão dos estatutos da nossa Sociedade, que já têm alguns anos. Sentimos que precisam de se adaptar à realidade atual e aos desafios que ela determina, permitindo também que a SPC se desenvolva para o futuro. Mas, iremos igualmente inovar na área da Educação e da Investigação. No que diz respeito à Educação, queremos contribuir para a melhoria da literacia em saúde cardiovascular da nossa população e iremos apostar na formação pré-graduada. Já ao nível da Investigação, vamos alavancar o Centro Nacional de Conhecimento e Desenvolvimento em Cardiologia (CNCDC), uma estrutura com 20 anos, no sentido de melhorar a sua qualidade, até porque Portugal foi um dos seis países escolhidos para participar no projeto de registos europeu EuroHeart e, como tal, precisamos garantir condições para que a nossa participação seja ao mais alto nível. Mas, queremos também desenvolver outras ferramentas de investigação associadas ao CNCDC que permitam aprofundar a sua atividade para lá do que tem sido o tradicional – os registos – e, ainda, começar a realizar estudos prospetivos, bem como a fazer uma ligação à área translacional. JM | E com o que é os jovens cardiologistas podem contar desta nova direção? LG | Os jovens internos e jovens especialistas de Cardiologia podem esperar, sobretudo, muito apoio desta direção. Podem contar serem sempre integrados nas atividades e decisões da SPC e, sobretudo, serem devidamente preparados para serem os futuros líderes da medicina cardiovascular portuguesa. Vamos continuar a ajudá-los a cumprirem os seus sonhos, a fornecer-lhes as melhores condições para que se exprimam no seu potencial, para que realizem a sua formação o melhor possível, de forma a tornarem-se cardiologistas de grande qualidade. Esta aposta nos jovens é absolutamente fundamental, porque terá com certeza um impacto relevante no futuro dos nossos doentes cardiovasculares. JM | Que mensagem gostaria de deixar aos sócios? LG | Em primeiro lugar, gostaria de deixar uma mensagem de esperança, de que vamos com certeza ultrapassar estes tempos difíceis de pandemia, que dificultaram tanto as nossas vidas. Depois, deixar uma mensagem de segurança, garantindo que esta direção irá trabalhar de uma forma muito intensa e séria para servir a SPC na melhor das suas capacidades. Temos vários projetos para executar e temos também a consciência de que, apesar de toda a nossa capacidade de trabalho, há ainda muito a fazer para continuar a reduzir o impacto da doença cardiovascular em Portugal. Por isso, precisamos de todos, dos sócios, para nos ajudarem nesta missão, para o bem dos doentes cardiovasculares portugueses. JM | Finalmente, qual a mensagem que dirige aos médicos de família, em concreto, enquanto parceiros essenciais dos cardiologistas? LG | Os colegas especialistas de Medicina Geral e Familiar (MGF) são absolutamente fulcrais para conseguirmos tratar bem os doentes cardiovasculares em Portugal. Esta direção irá dedicar-lhes muita atenção neste mandato, pois consideramos que são fundamentais para a identificação dos doentes que necessitam dos cuidados da Cardiologia e da sua referenciação atempada, mas também na continuidade dos tratamentos que são feitos na Cardiologia. Por isso, considero que esse trabalho de complementaridade entre as duas especialidades é mesmo obrigatório. Os que conhecem o trabalho que tenho realizado na Região Centro sabem que tem havido uma procura de interação e de interligação muito forte com a MGF e que esta relação tem evoluído de uma forma muito significativa ao longo dos anos. Contudo, temos ainda de tentar ir mais longe, quebrar algumas barreiras de comunicação que possam existir e tentar aproximar ainda mais as duas especialidades.

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