
A saúde está subfinanciada em Portugal. É uma doença crónica mas a cuja progressão não parecemos dedicar o devido valor. Para além da tecnologia, da eficiência, do desenvolvimento e de novas necessidades, basta o fator demográfico para provar que a Saúde vai exigir mais investimento.
Não há analista, comentador, alto dirigente ou político que não tenda a rechear o discurso com palavras muito modernas e responsáveis. Por isso, todos reclamamos mudanças não menos do que estruturais para o país. Essa é também a razão pela qual defendemos a sustentabilidade das políticas públicas.
Rejeito fazer qualquer juízo de valor sobre as declarações mas entendo que, para não cairmos na retórica ou em documentos inconsequentes, temos o dever de dar significado ao significante. Ou melhor, para o nosso futuro comum, infelizmente, nada é mais consequente do que a mera consolação de que as nossas elites expressam as preocupações corretas.
Gastei dois parágrafos para descrever o desalento com que vejo ser esquecido o capítulo da “sustentabilidade das finanças públicas” no Relatório do Orçamento do Estado para 2016 (páginas 61 a 64). Até se poderia pensar que este capítulo tem uma análise inócua ou que se trata de uma questão menor.
Nada disso. Repare-se que o documento oficial do Governo, assumindo os pressupostos do Relatório sobre o Envelhecimento da População (2015 Ageing Report) da Comissão Europeia, publicado em maio do ano passado, tem várias conclusões óbvias:
i. O envelhecimento da população levará a um aumento da despesa pública;
ii. Face ao momento presente, são as componentes de “Saúde” e de “Cuidados Continuados” que levarão a aumento da despesa pública;
iii. Saúde e Cuidados Continuados necessitarão de fundos adicionais da ordem dos 2,8% do PIB.
O que nos diz esta projeção é que, face à despesa de 2016 e aos atuais preços, o sector da Saúde, cuidados continuados incluídos, irá exigir mais cerca de 4,7 mil milhões de euros por ano.
Podemos negar, questionar as assunções ou refutar a análise mas o que não poderemos é fugir à questão. Felizmente estamos a viver mais anos e a longevidade (agravada em Portugal pela baixa taxa de natalidade), aliada ao nosso estilo de vida e às justas exigências civilizacionais em termos de cuidados e conforto, coloca a Saúde como uma prioridade absoluta.
Ora este é um problema que não se vai colocar inesperadamente daqui a 10 ou 20 anos, trata-se de um futuro perfeitamente anunciado. A resposta passa por prepararmos o país e o SNS para o que sabemos que nos espera.
“A melhor forma de prever o futuro é cria-lo”, dizia Abraham Lincoln (também há quem diga que a frase é mais contemporânea e de Peter Drucker mas para o efeito é irrelevante, se entendermos que o aforismo é certeiro!). A sustentabilidade das políticas, e neste particular caso, do SNS exige que não nos fixemos de forma míope no curto prazo.
No dia a dia somos bombardeados com informação sobre crescimento da despesa pública com a saúde (ainda que muito abaixo da média da UE ou da OCDE), com necessidades não satisfeitas em termos de prevenção e literacia, com entraves burocráticos e financeiros à inovação, com alguma acrimónia em relação a agentes do sector ou às reivindicações dos profissionais de saúde. A sustentabilidade, porém, só será alcançada se juntarmos esforços, delinearmos uma estratégia clara e assumirmos a determinação nacional de atribuir à Saúde uma nova prioridade reforçada.
Despesa Relacionada com o Envelhecimento da População (em % do PIB)
| 2013 | 2016 | 2020 | 2025 | 2030 | 2040 | 2050 | 2060 | |
| Despesa pública relacionada com o envelhecimento | 27,0 | 26,8 | 27,2 | 27,1 | 27,3 | 27,9 | 28,3 | 27,4 |
| Pensões | 13,8 | 14,0 | 14,6 | 14,9 | 15,0 | 14,8 | 14,4 | 13,1 |
| Saúde | 6,0 | 6,1 | 6,4 | 6,7 | 7,1 | 7,8 | 8,3 | 8,5 |
| Cuidados continuados | 0,5 | 0,5 | 0,5 | 0,5 | 0,6 | 0,7 | 0,8 | 0,9 |
| Educação | 5,2 | 5,0 | 4,7 | 4,2 | 4,0 | 4,0 | 4,3 | 4,2 |
| Desemprego | 1,5 | 1,3 | 1,1 | 0,7 | 0,7 | 0,6 | 0,6 | 0,6 |
Fonte: Relatório sobre o Envelhecimento da população 2015.
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